sexta-feira, 17 de abril de 2009

COMO TUDO COMEÇOU


COMO TUDO COMEÇOU

O engraçado é como tudo começou...
Sempre é uma interessante história de como alguém descobriu seu verdadeiro talento. Por exemplo, o vocalista da banda Mamonas Assassinas, Dinho, estava numa festa nas ruas do bairro quando a banda que tocava perguntou se alguém queria cantar uma música, com os amigos insistindo, Dinho acabou subindo naquele palco e cantando uma musica da Legião Urbana, não me lembro a música, mas o fato é que ele passou a ser parte daquela banda, virou líder dela, compôs inúmeras músicas que viraram inesquecíveis hits mesmo depois de uma dezena de anos passados da sua morte.
Se for falar de inúmeros famosos teremos interessantes histórias por toda a vida, mas e quem não se tornou famoso? Muita gente descobriu seu talento e não conseguiu a fama e continua no anonimato realizando ótimos trabalhos, tanto na arte como no social.
Infelizmente, não posso falar dos outros, só posso falar de mim mesmo.
Acredito que o meu maior talento seja o ato de escrever razoavelmente bem, então vou deixar o leitor sabendo como tudo começou.
Geralmente tudo acontece muito cedo, quando nem mesmo nos damos conta que somos alguém. Comigo não foi diferente, fui criado numa família de Testemunhas de Jeová, onde os estudos e leitura eram realmente levados a sério, ao extremo. A leitura era obrigação,mas havia harmonia na família,lembro da minha mãe contando inúmeras histórias infantis durante a noite, ela criava inúmeras delas e em certas vezes me solicitava a contar histórias também, com o passar do tempo reparei que em algumas noites só eu contava histórias pros meus irmãos, e o mais estranho de tudo isso é que mesmo quando eu reparava que eles já estavam dormindo eu continuava pra eu mesmo saber o final da trama que eu inventava.
O tempo foi passando, depois de tantos dias imaginando histórias pra contar de noite, eu decorava mentalmente algumas delas, eu entrei na pré-escola, não foi muito útil pra mim, lá existiam muitas brincadeiras e pinturas, mas eu queria muito mais que aquilo. Essas atividades, hoje penso assim, atrofiavam meu cérebro. Mas meus pais, muito envolvidos com a religião, nos liam muita coisa, e com muita paciência da minha mãe, aprendi a “ver” algumas palavras como nomes de personagens e cidades bíblicas. Isso sim era melhor que a escolinha.
Com cinco anos entrei na minha primeira série, claro que no segundo mês de aula já tinha completado meus seis anos. Mas entrei com cinco. Bem o fato não é esse e sim a minha felicidade em ter a oportunidade de aprender a ler, me imaginava lendo todos os livros que meus pais liam pra mim, eu iria poder ler sozinho. Mas é claro, ter a responsabilidade de manter meu material escolar em perfeito estado era uma regra a ser cumprida. Minha mãe numerava as folhas do meu caderno para que eu não as arrancasse, borrões eram iguais a boas palmadas. Num certo dia eu borrei meu caderno e pra apagar o borrão passei a borracha na ponta da língua e quando a borracha esfolou o papel e o furou... Entrei num desespero tímido e recolhido, sabia que quando chegasse em casa “a cinta ia cantar”, e realmente foi assim, me lembro da surra até hoje. Mas não reclamo da rigidez que, principalmente minha mãe, tinha comigo. Ela era insistente, comprava cadernos de caligrafia, “a prática leva a perfeição”. As vezes era triste ter que ficar fazendo o dever de casa quando era pra brincar, mas isso teve muitos bons resultados, apesar de menino eu tinha uma letra super bonita, algumas meninas até a invejavam, eu escrevia em letras de formas, letras de mão, deitava pra direita, deitada pra esquerda, eram diversos tipos de letras, isso pra mim, acabou virando uma arte, eu conseguia imitar quase todo tipo de letra. Mas se engana quem pensa que falsificar a assinatura do meu pai em advertência era o meu talento. Acho que meu talento foi descoberto na terceira série...
Ainda me lembro da professora Nilcéa da minha terceira série, um amor de pessoa, com o tempo descobri que pessoas amáveis conseguem extrair o que quiser da gente por não ter esse objetivo. Mas voltando ao assunto, numa certa ocasião minha professora pediu para que eu chamasse meus pais até a escola, eu não entendia, eu não tinha feito nada de errado até então, mas devido a educação que tive em casa, só abaixei a cabeça e consenti com o pedido da professora. No outro dia, minha mãe e a professora conversaram em particular e eu pensava: o que eu fiz dessa vez, vou apanhar quando chegar em casa e nem sei porque. Depois disso a minha mãe me chamou, ela tinha em mãos uma redação que escrevi durante a aula, falou amavelmente que a professora estava preocupada comigo pelo que escrevi na redação. A redação fala de choro em túmulo, de alguém que não voltaria mais, a morte de um ente querido...
-Celso, você teve alguma amiguinha que morreu ou que esta muito doente? – disse a professora – sua mãe disse que não houve problemas na sua família, então com quem que aconteceu isso, fala pra mim, nós estamos preocupadas com você. Por que você escreveu isso?
-Ah professora... - respondi com certo alívio – essa é uma história de uma vaquinha chorando pela outra vaquinha que morreu.
Daí virei o papel que escrevi a redação e mostrei o desenho, colorido, de uma vaquinha chorando com uma flor na boca em frente a uma lápide e um monte de terra. Elas suspiraram com um alívio... E eu fui pra casa e não apanhei!
Durante aquele ano fui muito especulado pela professora sobre de onde vinha aquela imaginação, ela lia em voz alta pra toda classe todas as minhas redações, e vivia sobre muitos elogios. Minha mãe mantinha um orgulho contido. Ela notou que eu tinha um certo talento mas não me elogiava e não falava a respeito, e, continuava com a rigidez de sempre a respeito de estudos e materiais escolares.
Um ano depois da “história da vaquinha”, minha alegria em escrever estava diminuindo,eram muitos papéis que se perdiam, eu comecei a ficar insatisfeito com isso. Eu senti a necessidade de uma organização particular, eu queria o que eu escrevia em letras impressas.
Enfim, terminei o ciclo básico de estudo, passei para a quinta série, eu estava indo para o ginásio (de quinta a oitava série). Foi quando meu pai me falou:
-Você passou de ano, vou te dar um presente, o que você quiser. E então? O que vai ser?
Meu pai me dizendo aquilo, o que pedir? Não pensei muito para responder:
-Eu quero uma máquina de escrever!
Fantástico, eu conseguiria resolver parte do meus problemas de organização e teria minhas letras impressas que nem nos livros! Isso pra mim era o máximo.
Imagina a minha alegria quando minha máquina de escrever chegou, uma linda Remington 25 portátil. Eu não desgrudava dela, dormia sobre ela. Eu datilografava todos os discursos dos meus pais (quando se apresentavam na tribuna do Salão do Reino das Testemunhas de Jeová).
Eu escrevia de tudo, sobre tudo... Foi quando li Espumas Flutuantes de Castro Alves, isso foi mágico pra mim, entrei num outro mundo, outro jeito de se escrever, um novo, mas antigo, jeito de falar. Isso é POESIA! Acho que não preciso dizer pro leitor qual é o meu estilo preferido de escrever, até hoje, pra mim, não existe livro de poesia melhor do que Espumas Flutuantes, Camões com Os Lusíadas que me desculpe, mas ninguém no mundo falou tão bem sobre o amor, sobre amores, sobre suas assombrações e seus deveres sociais como Castro Alves. Dentre tantas, O Laço De Fita é o meu poema favorito. Ele foi minha inspiração para iniciar escrever poesias, das poesias que nunca larguei, evolui para as composições musicais e daí para a música.
Hoje, sou Dramaturgo, músico, compositor, escritor e poeta. Essa é a minha arte! Mesmo no anonimato nacional continuo seguindo o meu caminho, infelizmente não ganho a minha vida com nenhum desses, apesar de já me renderem algo em diversas vezes, mas continuo porque é o que eu gosto, é o meu dom, a minha sina, talvez a minha “missão”. Pra uns é a minha perda de tempo, pra outros foi uma ajuda divina numa palavra, as vezes insignificante até pra mim.
Acredito que cada um que existe tem a sua “missão”, seja ela pra ajudar ou atrapalhar. Quem sabe eu possa espalhar uma certa alegria e esperança pelo que escrevo. Pois é disso que trato sempre, a chance de recomeçar, a esperança de que tudo vai melhorar, de que você tem o poder de mudar a sua vida para melhor, de que a imensidão é o limite. Sonhar faz bem, imaginar é um caminho pro “conseguir”. Por isso, como escrevi numa música, “rasgo o mundo em milhares de anos que vou escrever”. Esse é o meu talento, vou me aproveitar dele enquanto viver, porque faço do meu talento a minha alegria, o caminho para o amor incondicional, o caminho pra Deus, a vontade de continuar a viver, a vontade de continuar a fazer viver.
Mas o engraçado é como tudo começou...




                                                                                        Celso Kadora (17.03.09)

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